quinta-feira, 13 de junho de 2024

Sadako DX ou (Chamado 4: Samara Ressurge) inova ao propor crítica


DIREÇÃO: Hisashi Kimura

ROTEIRO: Kôji SuzukiYuya e Takahashi

GÊNERO: Mistério, Terror e Comédia

Como fã de filmes de terror não deixarei de mencionar essa obra-prima japonesa. Com uma crítica às redes sociais e as relações cada vez mais frágeis, ou inexistentes, entre as pessoas, acarretando o isolamento e individualismo, principalmente entre os mais jovens. SADAKO DX (ou o CHAMADO 4: Samara ressurge) inova ao atualizar uma relíquia das histórias de terror, que ficou mais famosa ainda com a franquia americana, e traz Sadako (ou Samara, como a conhecemos) como plano de fundo para um terror bem mais preocupante que assola a sociedade atualmente: o mal uso da internet em tempos de hipermodernidade.  

Muita gente está avaliando mal o filme porque está achando que é um filme de comédia. É preciso assistir com atenção e curtir cada ato. Tem terror, tem mistério e tem humor tudo na medida certa. Vocês perceberão nessa resenha algumas citações, porque fiz um paralelo com um livro que li faz pouco tempo e casa perfeitamente com a mensagem do filme, o “Hipermodernidade, multiletramentos e gêneros discursivos” de Roxane Rojo e Jacqueline Barbosa. 

RESENHA COM ALGUNS SPOILER SEM CONTAR O FINAL

A trama se passa no Japão, mortes misteriosas começam a acontecer e estão associadas a uma fita de vídeo (VHS), um programa de televisão resolve trazer este tema para uma entrevista. A nossa heroína nerd com QI de 200, Ayaka Ichijo (Fuka Koshiba),  e como ela mesmo diz: "É só um número!",  é convidada para esta entrevista do programa para contrapor as ideias de um xamã chamado Mestre Kenshin (Hiroyuki Ikeuchi), as perguntas são sobre a tal fita de vídeo que causou a morte de algumas pessoas de forma muito similar, Aysha defende que não é possível um filme causar mortes, já o xamã acredita que é a maldição de Sadako. O filme não perde tempo explicando a maldição por motivos óbvios: todo os espectadores, ou seja, nós, eu e você, que estamos assistindo, já conhecemos a história da menina do poço. 




Depois da entrevista Aysha fica muito famosa na internet, e tudo que ela descobre sobre a maldição ela compartilha achando que está fazendo o melhor, no entanto só está contribuindo para a disseminação desse “vírus”, pois seus seguidores compartilham e consomem suas postagens sem questionar. Como escreve Rojo (2015): 

"Nos tempos do hiper, não basta viver, é preciso contar o que se vive (...). Somos impelidos a buscar a novidade o tempo todo l, a não prescindir dela. A superficialidade se estabelece  como corolário: curtir/comentar nas redes sociais, sem refletir sobre o que se lê, apenas para não perder a oportunidade de se posicionar, na verdade, de aparecer ou de satisfazer (...)” (p. 121).

 


PERSONAGENS 

Aysha, a protagonista nerd, não acredita em maldições, muito racional e inteligente, ela é muito apegada a família e perdeu o pai recentemente. Não demonstra muito as emoções, é séria e solitária, interagindo apenas com a mãe e a irmã. Ela valoriza muito os números e tem uma visão muito autocentrada, ignorando a opinião dos outros ou conhecimento de seus colegas. Ela tem uma mudança no decorrer do filme, quando encontra o Príncipe, assim ele se chama.  


Oji Maeda (Kazuma Kawamura), o Príncipe - eu vi o filme dublado - , perdeu a namorada a poucos dias, por causa da maldição. Sendo ele o oposto de Aysha: Demonstra sentimentos, se apaixona facilmente e é muito medroso. Maeda já passou por vários relacionamentos e encara todos eles como paixões avassaladoras fazendo até uma tatuagem no braço em homenagem a uma ex-namorada, personagem construído para mostrar os relacionamentos líquidos.

Juntos os dois começam a investigar o que leva as mortes das pessoas tão rapidamente após assistirem ao filme, pois a maldição de Samara levava sete dias, mas neste filme a maldição se realiza em 24 horas (rápida como a internet, sacaram? e, também, li em algum lugar que 4 é número de azar no Japão, mas não pesquisei sobre), porém cada um com seu motivo; Aysha, precisa salvar a irmã e o Oji Maeda, a própria pele. 

Nesse meio tempo aparece um outro personagem importante, Bunka ou o Gato (Mario Kuroba), que é um nerd de computador que não sai de casa, na verdade, ele sequer sai do quarto, e que não mostra o rosto, usa um filtro de gato para esconder a identidade. Muito mais solitário que Aysha, pois simplesmente nem contato com a família ele tem. Esse personagem mostra, de forma triste, como a hipermodernidade funciona, a individualidade substitui totalmente o coletivo. As pessoas começam a se fechar completamente achando que são autossuficientes ou que a internet irá suprir suas necessidades como ser humano.

A Internet trouxe muitos benefícios, mas também deixou as pessoas mais manipuláveis e individualistas. Podemos ver no filme que a interação nas redes sociais só ficava mais forte na medida que as mortes iam acontecendo. Os personagens não saem da internet, tudo comentam e compartilham. O filme faz um alerta, temos muitos hábitos ruins e ficamos muito tempo online. 

"É a era do hedonismo individual, do hipernarcisismo. O culto e a contínua busca pelo prazer (imediato), a extrema fluidez dos pertencimentos atuais, a ausência de projetos coletivos em função das dívidas em relação ao futuro redirecionam o projeto de autonomia da modernidade, que passa a primar ela autocentração e pela não responsabilização do outro". (ROXO, p. 119)

CENÁRIO E FILME

O filme começa com um ar de terror muito sombrio, sem jump scare insuportáveis,  aos poucos começa a entregar humor, um humor muito sutil que vai crescendo sem ficar constrangedor, uma coisa divertida que vai acontecendo aos poucos, se observar bem essa mudança ocorre na medida em que os protagonistas descobrem como podem salvar as pessoas da maldição e se tornam amigos. 

Quando chega ao final, o filme já entrega o fechamento bem amarrado e uma faceta espetacular. Nos apegamos aos personagens e queremos vê-los bem. Sabe o ditado: "O que não tem remédio, remediado está", até conseguir encontrar a solução para um problema devemos levar a vida com otimismo, pois existem coisas muito valiosas que não tem preço: amor, amizade e companheirismo. 

Acredito que o humor do filme não acontece por acaso, está intrinsecamente relacionado com o amadurecimento dos personagens e sua relação com a internet. No início solitários, clima tenso, mais para o final estão unidos, o filme até fica mais iluminado, sai da escuridão para luzes amareladas. Gostei porque no fim a Sadako é usada como plano de fundo para discutir as relações humanas e a mutações que a hipermodernidade trouxe. E, atualmente, não temos mais medos de lendas urbanas como no passado.

Se deliciei com os momentos, ria, se assuste... Apenas divirta-se!!!! 

Eu assisti o filme uma vez e pretendo ver outras. 


NOTA: 9/10

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